terça-feira, 26 de abril de 2011

Abusada

Já fiquei com homens lindos que me disseram q eu sou linda e sexy. Já fiquei com mulheres lindas que disseram o mesmo. 
Quando era adolescente, a despeito da minha auto estima em frangalhos, achava que nada era páreo para meus seios grandes, cabelos loiros e saias curtinhas. Colocava meu batom vermelho e achava que estava arrasando. 
Hoje meus cabelos estão mais bonitos. De verdade que acho isso. Sei me vestir melhor, tenho estilo. Saias curtas não me pertencem mais. Uso muito mais maquiagem que só um batom vermelho. Mas não me sinto mais sexy. 
De alguma forma, aquela menina com a sexualidade a mil e sensualidade não censurada, foi embora. Em algum momento acreditei que a sensualidade não podia ser tão exaltada e cortei ela. 
Culpa do que? 
Culpa dos vários pés na bunda. Do abuso do professor que fez muito mais do que só o beijo que desejava. Culpa do amigo que nem era tão amigo e me estuprou em minha própria cama. Culpa do primeiro namorado, que queria me convencer de que era depravado, que o sexo não era tão natural assim. Culpa das censuras recebidas pelos mais velhos, por saberem o que rapazes mais velhos pensavam de garotinhas sensuais, por quererem me proteger. Culpa das relações erradas nas quais me meti, onde de alguma forma todos abusaram da minha autoestima inexistente. Culpa da minha falta de força de dizer não, de respeitar meus limites. Fui abusada. Mais de uma vez. Deixei que abusassem de mim. Não foi legal. O fato de eu ter deixado me abusarem não torna o abuso menos criminoso. Menos doloroso. Pelo contrário. Me faz sentir ainda mais culpada. 
Deveria ter dito não ao professor. Ter impedido ele de tocar meus seios, de morder tanto meus lábios, de ter esfregado o pinto duro dele em mim.
Deveria ter dito ao meu primeiro namorado que não queria que ele gozasse na minha boca. Que meu prazer era importante também, que aquilo tudo me fazia sentir humilhada. Não deveria ter deixado ele transar comigo depois de ter terminado o namoro. Não deveria ter me humilhado daquele jeito na esperança de que ele não fosse embora. 
Deveria ter mantido meu amigo do lado de fora de casa. Não deveria ter deixado ele entrar. Vi que ele estava fora de si, e ainda assim deixei ele entrar, porque eu tinha provocado ele e por isso deveria arcar com as conseqüências. Ora, eu não queria, e isso deveria bastar! 
Deveria ter dito não. Deveria ter sido mais firme quanto ao uso da camisinha. 
Fui tão humilhada por aquele chefe. Me sentia tão atraída por ele, e ele foi tão estúpido. Gozou sem se importar comigo, me tratou feito lixo depois. Me bateu quando eu não quis mais. Deveria ter revidado. Deveria ter sido mais firme. Deveria ter mais controle.
Deveria ter dito não à toda aquela tequila. Ainda assim, depois da tequila, deveria ter dito não ao motel. Deveria ter dito não ao sexo sem proteção, deveria ter tomado uma atitude. 

Os adultos sabiam disso, sabiam que essa sensualidade solta somada à ingenuidade e falta de auto estima traria isso. Censuraram minha sensualidade, minha sexualidade. Queriam me proteger, não os culpo. Mas de nada adiantou. Perdi a ingenuidade, a sensualidade, mas não deixei de me machucar, e muito. 

Eu fui tão abusada. E me dói tanto, e eu faço de conta que não foi nada. Faço de conta que sou forte, faço de conta que não me machucou.
Me arrancaram pedacinhos. Um a um. E eu deixei. 

O que me restou? Uma cicatriz enorme. Fora a fora em meu ventre. Machucada, calejada. Eu não poderei nunca voltar a ser aquela menina leve e sexy sem pesares. Nem quero. Aquela menina era ingênua, não sabia o que fazia. Ela se deixou abusar, porque achava que assim é que era, porque achava que estava arrasando, que ela é quem estava tirando vantagem. Não era plena, embora tampouco eu o seja agora. 
Não sou mais aquela menina. Mas ainda não sou a mulher que pretendo alcançar. 
Sou um meio termo sem definição, sem termo próprio. Tenho todas essas cicatrizes dentro de mim e queria poder curá-las. Eu preciso enterrar essa menina que se deixou sofrer. Preciso transmutar ela. Sem isso, todo o resto será apenas superficial.

2 comentários:

  1. Minha querida, só posso desejar que você supere tudo isso. Já tive problemas graves de auto estima. No meu caso, porém, consegui separar bem o sexo disso tudo. Já errei nesse aspecto, lógico, mas minha baixa auto estima podia ser vista claramente ao aceitar que alguns homens fizessem o que queriam comigo - como, por exemplo, darem mais importância a problemas não tão importantes, desde que fossem deles, e não "cuidarem" de mim quando precisei. Mas superei. Sabe como? Amando todo mundo. TODO MUNDO. Sem medo de rejeição, sem medo de que as pessoas não me aceitassem. Há os que não aceitam? LÓGICO. Mas, sinceramente? Que se danem! Somos muito maiores e melhores que isso. Fui ao show do Paul McCartney no Rio esse fim de semana e ele termina o show com uma frase muito bacana. É o meu lema de vida: "And in the end, the love you take is equal to the love you make". Façamos amor. O tempo todo. Com a gente mesmo, com nossa família, nossos bichos de estimação, colegas de trabalho. Só o amor pode nos curar de tanta dor. Boa sorte, e me mantenha informada. Um beijo muito grande.

    ResponderExcluir
  2. Letícia, acho que ando superando essa coisa toda. Existem as cicatrizes, mas entender porque elas estão ali me faz lembrar que já passou, que eu consegui sobreviver a isso. Ainda sou eu mesma, embora um pouco menos ingênua.
    Me indigna sim essa situação, de tantas mulheres serem abusadas, dessa culpa em torno de todas nós, como se realmente acreditássemos que somos as culpadas da queda do paraíso e portadoras do pecado original. Lentamente, acredito que isso possa ser mudado. Só da coragem de contar o que aconteceu, é uma cura que acontece. Uma a uma, se libertando da culpa.
    Obrigada pelo carinho. Beijo!

    ResponderExcluir